Helena admirava, pela janela do ônibus, a paisagem, que passava lindamente rápida por seus olhos cristalinos. Por mais que o entusiasmo fosse geral dentro daquele automóvel, a moça permanecia focada no show de imagens. Imagens que se passavam e não havia jeito de voltar, a não ser pela lembrança. Como tudo na vida.
Interrompida por uma de suas colegas, foi obrigada a participar da brincadeira com os outros alunos. Muitos haviam “roubado o Pão de João”, até que foi a vez de Helena. Sem jeito e com um sorriso incerto, deu a atenção devida à brincadeira. Apenas suas mãos mexiam-se para as palmas. Nada mais. Até que se cansou. Voltou à janela e retomou seus pensamentos.
Novamente interrompida pela exaltação da chegada à escola, a jovem menina tomou sua bolsa e andou em direção à porta principal. Observava a todos. Como haviam mudado! Os meninos mirrados, bobos, agora eram rapazes esbeltos, uns mais do que outros. As garotas, agora com cabelos estilizados, roupas apertadas e algumas até mesmo com piercings. Trocavam-se as bonecas por celulares e as bolas de futebol por mochilas de ombro.
Procurou a mesma roda a qual frequentava no ano anterior. Ali, falava-se e falava-se sobre o verão, garotos, música, bebidas, sexo...
Sexo? Teriam essas férias sido mais longas do que imaginara? Assunto esse que Helena e sua melhor amiga discutiam normalmente pelo fato de terem entendimento e maturidade suficientes. Helena e sua mãe.
Ao retomar à conversa na roda, após o rápido devaneio, ouviu de uma de suas companheiras a palavra “velha”, seguida de “chata”, “rabugenta” e... “mãe”.
Como ousava aquela menina referir-se à amiga de todos e todas com tais palavras? Palavras que ardiam, sangravam-lhe o coração ao serem digeridas. Helena, como sempre, não desperdiçaria tempo nem lágrimas com aquilo. Simplesmente virou as costas e saiu, como costumava fazer, motivo pelo qual nenhuma das outras, coniventes com o descaso de uma, deu atenção à súbita saída da jovem.
Ignorando o sinal, foi para fora. Ao contrário de cinco minutos atrás, agora tudo estava calmo, dentro e fora. Ouvia o som dos pássaros, o vento frio acariciava seu rosto, rasgando-lhe a face. Era bom. Sentou-se ali mesmo, na escada da porta principal, de frente para o jardim gramado.
Do que valia ter alguém se, um dia, todos tornar-se-ão velhos, chatos, rabugentos? Seria Helena uma das poucas – senão a única – a pensar diferente? Não fazia sentido.
Aprendeu que crescer fora e sempre seria sinônimo de amadurecer, aprender. Porém, via algo diferente nesses que a acompanhavam. Grandes e pequenos ao mesmo tempo. Crianças crescidas de tamanho tomando gostos e opiniões deturpados.
Helena era uma árvore. Uma árvore firme, sustentada e forte. Faltavam-lhe flores. Flores que um dia haveriam de surgir.
Esperava-se feliz e triste, pois sabe que, depois de firme a árvore, suas flores surgem saudáveis e infinitas. Mas se estas aparecem duvidosas antes mesmo de a base crescer para sustentá-las, tempo e esforço serão necessários para endireitar as coisas.